Os Últimos Cangaceiros - Filme de Wolney Oliveira
Eu cresci ouvindo "Minha filha, você é uma Barros. E Barro é mulher valente. Pode num ter sido parenta direta de Lampeão, mas é mermo que fosse. Quero é ver o hômi que mexer com uma, vai se dar mal, muito mal esse daí." Depois do riso solto (mal sabia eu o quanto aquela história era verdade), assim nasceu uma lenda pra mim "e quem diabos é Lampeão?"
O filme do Wolney Oliveira, "Os últimos cangaceiros", que está em cartaz no Cinema do Dragão do Mar, precisa ser visto por todos, porque tá de uma beleza extraordinária, uma montagem incrível, além de claro ter uma história e tantas memórias recontadas por lá.
Traçar um resgate acerca do movimento do cangaço trazendo a luz os dois únicos integrantes reminiscentes é de uma força espetacular. O filme traz a história de Durvinha (Jovina Maria da Conceição) e Moreno (José Antonio Souto), como plano base e desvela a partir daí, não apenas o movimento do cangaço, mas as brigas, amores e arroubos de paixão que ele deixou nesses que direta ou indiretamente participaram: mães, pais, irmãos, filhos e filhas, mulheres capturadas e tudo o mais.
Uma outra memória certeira é minha mãe a cantarolar a música de Amelinha pela casa, quando ela tava pra contar a história pros alunos dela em sala de aula:
Virgulino Ferreira, o Lampião
Bandoleiro das selvas nordestinas
Sem temer a perigo nem ruínas
Foi o rei do cangaço no sertão
Mas um dia sentiu no coração
O feitiço atrativo do amor
A mulata da terra do condor
Dominava uma fera perigosa
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor
Esse Pessoal do Ceará tá no meu coração faz tempo... Lampeão então virava uma das histórias nada ficcionais, mas que até parecia de tão incrível que era, no meu imaginário, a nível de: As mil e uma noites, os livros do Malba Tahan que tinham por casa, as aventuras do Robinson Crusoé e do Marco Polo. Só que ele tava aqui do ladinho, era de verdade e tinha feito aquele alvoroço todo.
Claro, o cangaço não são só festejos e maravilhas, muito pelo contrário, teve um bocado de coisa tensa, era matar ou morrer e essa lógica de mundo só é possível de entender depois de um tempo, dum cansaço de vida. No entanto, no filme Os Últimos Cangaceiros estamos para lembrar da valentia desses tantos, de ter precisado criar uma milícia que passou mais de ano só pra pegar um sujeito audacioso. E que só acabou, e esse parece ser o fim das melhores histórias do pessoal mais valente, por causa dos P2 infiltrado. De dinheiro, da ganância, muito maior que lealdade ou confiança.
E o amor? E a tal bonita? O hômi chêroso e tudo o mais? Os relatos de Moreno e Durvinha sobre o período que acompanharam Lampeão, as festas, o ouro todo que tinham, os adornos e tudo o mais são de crescer os olhos diante da tela, a memória desses dois é incrível! E memória é algo tão interessante se pararmos um momento pra pensar, ela é aquilo do qual retiramos e guardamos nosso extrato favorito do vivido e ela pode ser outra coisa completamente diferente do que foi experienciado, ela pode se fazer de longos retratos guardados ou apenas resquícios misturados, como um breve sonho.
Vocês precisam ver esse filme, o final é de tirar uma risada e um suspiro ao mesmo tempo. É de uma delicadeza o contar desses dois, que por mim ficava mais uma hora lá só escutando.
Obrigada, Wolney Oliveira pelo presente, só nos deixou (pelo menos a mim) com ainda mais vontade de ver as filmagens do corajoso Benjamin Abrahão, que seguiu aquele bando. Além das horas de conversa com esses dois personagens icônicos.
O filme está em cartaz no Cinema do Dragão do Mar, corram pra assistir, porque ainda dá tempo!!!
Eu não sei porque cheguei
Mas sei tudo quanto fiz
Maltratei fui maltratado
Não fui bom, não fui feliz
Não fiz tudo quanto falam
Não sou o que o povo diz
Qual o bom entre vocês?
De vocês, qual o direito?
Onde esta o homem bom?
Qual o homem de respeito?
De cabo a rabo na vida
Não tem um homem perfeito } bis
Aos 28 de julho
Eu passei por outro lado
Foi no ano 38
Dizem que fui baleado
E falam noutra versão
Que eu fui envenenado
Sergipe, Fazenda Angico
Meus crimes se terminaram
O criminoso era eu
E os santinhos me mataram
Um lampião se apagou
Outros lampiões ficaram
O cangaço continua
De gravata e jaquetão
Sem usar chapéu de couro
Sem bacamarte na mão
E matando muito mais
Tá cheio de lampião
E matando muito mais
Tá assim de lampião
E matando muito mais
Na cidade e no sertão
E matando muito mais
Tá sobrando Lampião
Lampião falou - Luiz Gonzaga
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